sexta-feira, 5 de março de 2010

Genialidade gera gentileza! Yeah, yeah, yeah!




O gênio toca e sorri. Poderia comandar seus músicos com a mesma mão de ferro habitual de quem já atingiu os “píncaros da glória”. Poderia ser prepotente, mau-humorado e arrogante, afinal esses desvios – nos gênios – são facilmente perdoáveis. Em alguns casos, geram em nós, simples mortais, uma aproximação masoquista, um desejo de ver um deus zangado, no auge da sua fúria (e de sua fama), dando ordens, exigindo cem toalhas brancas e energéticos com a fruta da estação.

Mas este gênio de ontem apenas sorri. Concentra-se em seus movimentos e reproduz com alguma dificuldade suas obras-primas.

Ontem, depois de assistir ao show do Lanny Gordin, fiquei agradecida ao universo por ter me concedido a oportunidade de vê-lo tocar. E eu poderia ficar grata apenas por saber que o monstro está vivo e continua assuntando e mordendo a bunda dessas guitarrinhas chinfrins que a gente escuta todos dos dias no dial.

Mas o que me tocou profundamente foi a sua gentileza para tratar homens e instrumentos musicais.

Ele disse poucas palavras. Pouquíssimas, para a verborragia contemporânea. Acostumados que estamos ao “parlatório infindável”, poderíamos hora ou outra sentir falta de um “agora eu vou tocar essa, que foi gravada por tal pessoa”. Mas o Lanny, esse cara de palavras mínimas, começou a abordagem com um “boa noite, meus amores”, quase no final do show. E esse “boa noite” valeu cada milímetro de expectativa que eu tinha dele. Na verdade, cada milímetro de expectativa que eu ainda deposito em qualquer ser humano.

Depois de tocar em muitos dos discos considerados geniais da MPB, e de ser o preferido de mestres como Rogério Duprat, Lanny não possui nenhum traço de afetação.
O que Lanny Gordin, um dos guitarristas mais geniais da história dessa pátria desimportante, possui são sinais visíveis de seus problemas de saúde relacionados com a esquizofrenia, doença que nunca escondeu de ninguém.

Mas isso é tão pouco perto do que o Lanny se tornou. Isso é tão pouco perto do que as pessoas podem se tornar quando desejam ser honestas consigo e com os outros.
Na verdade, o que eu senti em relação ao show foi exatamente isso: uma honestidade profunda de um homem genial e gentil.

Sem discurso pronto, sem palavras suplicantes, sem tom de pedidos de aprovação, Lanny terminou dizendo: “muito obrigado, meus amores. Tenham uma boa noite, e a vida continua.”

Sim, Lanny, a vida continua. E continua mais bela e mais leve, por sua causa. E eu fiquei mais feliz. Feliz e confiante de que mesmo depois de muitos infernos pessoais a gente consegue sorrir francamente. Mesmo depois do gosto amargo da loucura e da solidão, é possível presentear aos outros com acordes e palavras de mel.

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